A sala estava vazia. No centro rosas brancas manchadas de vermelho sangue. O silêncio era assustador mas ao mesmo tempo trazia uma paz que outrora não sentia. O cheiro das flores com o sangue me fez sentir náuseas, corri até o banheiro e lá perseguindo um rastro de vida coagulada, encontrei bilhetes de amor, de despedidas, bilhetes de agradecimentos. Com as mãos trêmulas reconheci a letra, abri rapidamente o papel que trazia além de agradecimentos um perfume doce, sutil, que contrastava com as seguintes palavras: "Obrigado pai pelo seu silêncio, obrigado mãe pelo seu adeus doloroso, obrigado amor por sua falta de amor. Obrigado Deus por sua apatia e compreensão infinita que permite aos homens se deliciar de fantasias, promessas e alienações, amenizando assim a dor de cada dia."
Pétalas de rosas pareciam brotar por toda a parte. Confuso passei os dedos entre os cabelos e os senti molhado. Foi quando percebi que não estava sozinho. No canto do banheiro um corpo brotando vida. A beleza das flores sempre o contagiou e agora era silenciada assim como suas ideias, confusões, limitações tão importantes e valiosas. Estava lá, jogado entre livros abertos, rodeado de poesias e teorias. O fim, enfim consumado.
Sim, trazia no rosto uma expressão de alívio. Covardia? Não, não se limitava aos julgamentos do senso comum. Cansado, com a pele marcada de feridas a nunca mais serem cicatrizadas, segurava nas mãos um verso incompreensível para quem pouco conheceu o amor. "O que a memória ama, fica eterno. Te amo com a memória, imperecível" (Adélia Prado). Me vi, e arrependido, chorei.
Marco Monteiro